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quarta-feira, 23 de junho de 2010

Os dois Stevens – Parte 1

O Steven fez o mundo chorar na despedida de E.T., nos deu o arqueólogo Henry Jones Jr, nos levou ao futuro e ao passado, nos fez ter medo de ir à praia, que nos mostrou extraterrestres simpáticos e convidativos. O outro Steven nos deu também visões realistas e bem embasadas da segunda guerra, um Pinóquio futurista, invasores que destruíram nosso planeta, uma perseguição a terroristas e uma visão do holocausto. Ambos são Spielberg, a mesma pessoa, o mesmo diretor e produtor, o homem que evoluiu do sonho à realidade e à realidade do sonho.

A carreira de Spielberg teve basicamente duas fases: a primeira mais criativa, diversificada, em que o homem nos surpreendia com personagens cativantes e situações surreais. Nesta fase a suspensão de descrença era a regra. Por suspensão de descrença, diga-se a atitude do expectador de aceitar o que lhe é mostrado, sem usar os erros inerentes e a falta de lógica como armas para desacreditar a trama ou a mensagem que lhe é passada. Sem a suspensão da descrença, esta fase do diretor não pode existir.

Spielberg lida com nosso imaginário, nosso medo do desconhecido aos nossos anseios e sonhos universais. Em Tubarão, Contatos Imediatos do 3º Grau e Jurassic Park há três suspenses. O primeiro de um assassino sem nenhum impedimento moral, sorrateiro (ou deveria dizer submerso?), que mata por ser o que sabe fazer e o que o mantém vivo e nós temos que enfrentá-lo a todo o custo. Já no outro, o suspense é o de encontrar seres evoluídos, que poderiam destruir o mundo, mas no final, a mensagem de um contato pacífico é o que fica. O último é um misto dos dois primeiros, com muito mais do tubarão assassino, claro, mas é impossível não entrar na onda de emoção e euforia dos paleontólogos quando vêem seus objetos de estudos vivos à sua frente.

Nossos arquétipos também estão dentro desta fase. Indiana Jones, o intrépido arqueólogo, com trejeitos, chicote, que só levou uma bala de raspão em mais de mil que lhe atiraram e enfrentou os nazistas, conseguindo até um antológico autógrafo de Hitler, nos traz o arquétipo do herói indestrutível. E.T. é o melhor amigo do qual nunca queremos nos separar, aquele que faz nós nos encontrarmos, que nos mostra o melhor que temos a oferecer. Temos uma idéia do primeiro grande caso de Sherlock Holmes, vemos o grupo com a amizade inesquecível e uma aventura que muitos gostariam de ter até hoje com os Goonies e vemos um Peter Pan adulto reviver sua juventude, nos mostrando a eterna criança que carregamos e que muitas vezes negligenciamos.

Em De Volta Para o Futuro, a ficção científica lida com o paradoxo do avô, com a responsabilidade diante de um poder que pode, e muda, a história. O caricato Dr. Brown, com seus cabelos esvoaçados, olhos esbugalhados, retratos de cientistas, um homem que dedica seu coração e mente à ciência a ponto de não ter na vida pessoal ninguém além do seu cachorro e de Marty McFly, o típico oitentista, também caricato, que anda de skate, falando algumas gírias, mas de atitude, sempre apaixonado por sua namorada. A visão otimista do futuro, a diversão que sentimos que foi para o diretor em filmar no velho oeste e nos anos cinqüenta, o mar de referencias tanto auditivas quanto visuais, os vilões da mesma família, sendo este um dos filmes em que Spielberg mostra sua maturidade de meninice cinematográfica, um sonhador nato.

Estes filmes, além do trabalho dado nos personagens, vemos os closes, os grandes ângulos, trilhas empolgantes, quase todas de John Williams, o uso de efeitos especiais que ajudam, mas não atrapalham a história, e uma brincadeira atrás de outra seja nas tramas impossíveis, nas resoluções improváveis mas críveis dentro do universo criado, Steven se realiza, como o Peter Pan adulto que descobre que pode ainda ter algo de criança dentro de si. A obra nos trás um alívio da dura realidade, uma fuga sempre para um mundo diferente, em que piratas existem, brontossauros podem ser alimentados na boca, Nazistas estão sempre no seu pé ou seu melhor amigo nem daqui é.

Continua...

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