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quarta-feira, 23 de junho de 2010

Maldito seja meu telefone celular

Vou ser bem honesto: odeio meu celular. Odeio é a palavra correta, não consigo achar outra melhor. E por que é que eu não me livro dele? Ora, como toda maldição, não é tão fácil. Antes, quando não tinha celular, a vida podia até ser mais complicada, mas eu gostava.

Enquanto eu estava no cinema, não tinha ninguém me ligando pra ir comprar pão; enquanto namorava ninguém me ligava perguntando de que horas chegava ou como é que se liga o videocassete ou para dizer que não sei quem ligou para minha casa me procurando. Eu não era interrompido em nada e quando sentia necessidade de fazer uma ligação, comprava um cartão telefônico ou então usava a cara de pau que Deus me deu para pedir permissão para usar o telefone, sempre ligação local, claro.

Então veio o desastre, até parecendo um conto de Edgar Alan Poe. Minha mãe se cansou de não saber se eu tinha sido seqüestrado pelo Don Corleone ou abduzido pelo George Lucas e me deu um celular. "É para você puder se comunicar com a gente", me disse. Até parece que eu não fazia isto antes.

Fiquei com aquele aparelho nas mãos, como se estivesse olhando meu obituário. Àquela época, todos os meus amigos tinham seus celulares e sempre que o tiravam do bolso, faziam uma cerimônia quase religiosa. Limpavam a garganta, procuravam o número com o teclado e soltavam um sorriso sarcástico para mim, pois eu ainda estava no mesmo patamar de Bell, dependendo da telefonia fixa. Agora eu saía da pré-história e saltava para o futuro.

Em cinco minutos aprendi o básico e nos próximos cinqüenta e cinco, fiquei jogando snake 2. Pelo menos o jogo era legal e eu me tornei destaque nele. Na primeira semana com meu novo aparelho celular no bolso, eu o tirando de vez em quando para ver a hora, talvez para me amostrar um pouco para os que não tinham ainda aquilo que me aproximava dos Jetsons, o milagroso aparelho. Na segunda semana, ainda convencido de que aquilo era apenas um brinquedinho que por corujisse materna acabou parando em minhas mãos, decidi que não o levaria para o colégio.

Devo dizer o quanto senti falta. Parecia meio cafona olhar as horas no relógio e não poder passar mensagens idiotas cheias de desenhos e frases feitas para meus conhecidos. Na aula de matemática senti mais falta ainda, pois não tinha mais a calculadora. Tive que fazer as contas no velho método do "lápis-papel-borracha".

Cheguei em casa e vi que tinha oito ligações e cinco mensagens recebidas. Retornei cada uma das chamadas não atendidas e o que recebi como resposta? "Ah, liguei pra saber se a fila do lanche estava grande", "Não foi nada, era só pra dizer que o filme não tá passando", "Foi mal, liguei errado". Quanto às mensagens... "Te dolo muitcho, miguinho", "Vc ñ tem 1 cd p/ me emprestar ñ?"

Eu fiquei me remoendo de saudade por causa disso?! Então decidi deixar o celular desligado, eu nunca mais usaria outro até que tivesse uma vida agitada, cheia de compromissos, quando eu deveria tomar decisões num piscar de olhos e coordenar a ação de várias pessoas à distância e em pouco espaço de tempo. Minha determinação me levou longe e duas horas depois eu estava novamente com o celular ligado e dentro do bolso.

Depois disso me conformei. Com o tempo algumas coisas ficaram realmente mais fáceis, mas gosto mais dos tempos antigos. Quando eu e meus amigos combinávamos para ir ao cinema, era uma operação logística danada de grande. Ligávamos um para o outro várias vezes, fazíamos lista de quem ia, quem não ia e quem estava em cima do muro. Combinávamos um lugar e dávamos um prazo para cada um chegar. Agora... "Bora para o cinema, o filme começa em meia hora" "Vou ver..."

Pior foi quando começou a corrida celularista. Muitos invejando poucos por terem celulares menores, mais horrivelmente futuristas em termos de design, com mais jogos, viva-voz, toques polifônicos... Junto a isto vieram as grandes promoções. Todos trocando celulares, barganhando para conseguir o melhor pelo menor preço e rindo dos dinossauros que eram uns cinco centímetros maiores e cem gramas mais pesados.

Eu consegui me esquivar desta mesquinharia toda, mas acabei trocando o celular por outro por causa de uma promoção que veio realmente a calhar. Agora tenho tantos minutos que fico ligando para o povo só para gastar mesmo.
O celular acabou virando uma parte tão importante de minha vida quanto um dedo na mão, ou a mão toda dependendo de quantos toques polifônicos. Não tenho mais paz e todo mundo me encontra. Tudo bem que posso dizer que a bateria está descarregando, pelo menos esta porta de saída eu tenho...



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