Faz quase um ano que terminei a faculdade e quase 10 que terminei o colégio. Claro que depois de tanto tempo, a pessoa muda e a história de cada um o leva a diferentes lugares e situações, mas comum a qualquer pessoa há a capacidade, embora nem sempre usada com propriedade, de voltar um pouco no tempo e sentir saudades daquilo que era bom.
Relembro este tempo que já passou pois descobri que sentia mais falta dele do que imaginava, pelo menos falta de certos aspectos e pessoas. Fui recentemente para uma palestra no Memorial de Medicina, lugar muito pouco frequentado pelos jovens cuidadores de hoje, e minha grande ansiedade não era por já estar cansado e com sono, pedindo cama, ou ter muita coisa para estudar e muito menos o teor das palestras. Não, isso não passava por minha mente, embora os olhos estivessem difíceis de se manterem abertos e as pernas não reclamassem tanto de estarem em repouso.
Era um palestrante em especial que me motivava ir para lá, muito mais do que aquela necessidade idiota de mostrar serviço e comprometimento para alguém que está ainda no começo da residência. Foi um professor meu da faculdade, professor de Semiologia, que não ensinou apenas anamnese, exame clínico e algumas doenças importantes. Sua forma de nos tratar e tratar os pacientes trouxe a todos um aprendizado muito maior do que livros. Lembro-me de ter lido um conto em que um dos trechos dizia: Ele é feito livro, não aprende nada, apenas passa informação.
Não, esta frase não se aplica a meu saudoso mestre, mas a outros que nunca terão dada por mim esta alcunha. O homem ensinava e aprendia, e, talvez dentre todos os professores que tivemos na faculdade, foi o que mais se destacou, sendo uma unanimidade. Outros podiam ter excelência superior, mais cabelos brancos e títulos, podiam ser didáticos, mas este em especial nos fazia sentir aquilo que não é tão fácil ser na medicina: colega.
Durante sua palestra, da qual confesso que não lembro muita coisa, senti-me de novo um estudante ainda verde de tudo. Talvez, se entrasse naqueles momentos reflexivos açucarados, poderia me ver de novo na faculdade junto à minha turma, prestando atenção a uma aula que já devia ter sido dada várias vezes para outros antes de nós. Seja como for, foi reconfortante vê-lo outra vez e lembrar de onde eu estava e onde cheguei e ter a certeza de que ainda o chamarei de mestre.
Voltarei mais no tempo para o colégio, onde tive o privilégio de ter certas pessoas como meus professores e amigos. A um deles, por exemplo, devo todo o conhecimento que tive de História do Brasil. Outro me ensinou religião, mas não me jogou a cartilha católica pelos ouvidos e goela abaixo, mas me fez acreditar que há pessoas boas e que é aí que estar a arte de ter fé. Claro, há mais idiotas no mundo, mas pelo menos a maioria é do bem. Outro ainda me ensinou uma Geografia que não fazia tendência cega a partidos, siglas ou orientações de trânsito. Mais outro, chamei de Meu Mestre e até hoje é um de meus melhores amigos.
Nestes tempos, eu não sabia ter a sorte imensa de poder encontrar com estas pessoas casualmente, esbarrar num corredor, poder a qualquer momento tirar uma dúvida ou testemunhar um evento histórico. Quando houve, por exemplo, os atentados ao WTC em 2001, um destes professores de colégio saiu correndo pelo corredor e escadas abaixo para ver as cenas que o mundo não acreditava ver. Podia ter me mandado para a sala de aula, pois eu estava do lado de fora ouvindo a notícia que meu amigo me passava por celular, mas chamou-me para também assistir e não perdoou que eu começasse a fazer perguntas. Era algo grande demais para ser respondido de imediato e nunca esqueci disso.
Hoje, cercado por estas boas lembranças, sinto que faltam-me novos mestres, novos nortes, mas posso ter a certeza, e espero que eles também, que tanto eu quanto outros que vivenciamos tantas coisas boas e ruins, temos até hoje a sorte de olhar para trás e ver se a bússola que nos deram nos aponta ainda o mesmo lugar.
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